O Serviço Psiquiatria e Saúde Mental Infância e Adolescência do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (HFF) aborda nesta rúbrica o tema que marcou a atualidade e gerou recentemente polémica na opinião pública – a gestão das “birras” nas crianças pequenas.

Desde o nascimento, a criança comunica o seu mal-estar e necessidades através do choro. Chora quando sente um desconforto, o que ativa os cuidados do adulto e a satisfação das suas necessidades (comer, mudar a fralda, carinho, entre outras).

Por volta dos 18 meses, a criança adquiriu várias competências psicomotoras: é capaz de andar, comunicar e está mais consciente de si e isso permiti-lhe explorar o ambiente à sua volta. Ela começa a reconhecer-se como indivíduo e a perceber que é capaz de decidir as suas próprias ações. Surge a necessidade de se separar dos pais e de fazer cumprir os seus desejos, iniciando-se a fase do “não”.

Sempre que possível, os pais devem respeitar esta autonomia, dar espaço à criança para ser ela a liderar as brincadeiras e seguir os seus interesses quando brincam com ela. Contudo, nalgumas situações, é necessário colocar limites que impedem a criança de satisfazer os seus objetivos, o que frequentemente leva a criança a protestar, ou fazer “birra”.

As “birras” ocorrem quando a criança se sente sobrecarregada por uma emoção intensa, como a frustração ou a raiva, que ainda não é capaz de processar. Faz parte do desenvolvimento normal das crianças, sendo mais intensas no período dos 18 meses aos 4 anos.

Sabemos, então, que a criança não faz “birras” porque é má ou porque quer atacar os pais. Ela faz “birra” porque não tem a capacidade de gerir as suas emoções negativas intensas e precisa que os adultos a ajudem a regular as emoções e a retornar à calma. Se as crianças não receberem esta ajuda, elas não vão conseguir resolver as emoções que causaram a “birra” e correm o risco de não aprender estratégias de regulação emocional.

Apesar de as “birras” serem uma expressão emocional das crianças, isto não significa que não levantem importantes desafios aos pais. Os pais podem sentir emoções negativas, tais como ansiedade, zanga ou mesmo vergonha quando estas acontecem em público. Por isso, os pais devem estar atentos às suas próprias respostas emocionais e procurar manter a calma perante uma “birra”, porque não só ajuda os seus filhos a tranquilizar-se, como a resposta dos pais funciona como um modelo de auto-regulação para os filhos. As crianças aprendem muito através do que observam dos seus pais e cuidadores.

Entre as estratégias mais eficazes para ajudar a criança face às birras, destaca-se falar com um tom calmo e o uso de palavras simples, limitar o número de ordens ao que é realmente importante, distrair a criança propondo-lhe outra atividade e estabelecer contacto físico de forma afável. É muito útil tentar compreender a causa da birra e dizer à criança o que achamos que está a sentir “Eu vejo que estás chateado porque…”, porque isso ajuda-a a estar mais consciente e saber identificar as emoções que está a sentir.

Com a presença e o apoio dos adultos, a criança, à medida que vai crescendo, aumenta a sua capacidade de tolerar a frustração, a zanga e a tristeza que surgem frequentemente quando algo não corre como gostariam. Elas aprendem que também estas emoções e situações são temporárias e que se vão resolver.

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